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Com combinação de anticorpos naturais, injeção anti-HIV dura até sete meses

Com combinação de anticorpos naturais, injeção anti-HIV dura até sete meses

Considerados um avanço no tratamento da Aids, os antirretrovirais têm, entre os obstáculos, a necessidade de o paciente seguir uma rotina diária de ingestão de comprimidos, sob o risco de ser acometido pelas complicações da infecção.

Para tornar o tratamento mais simplificado, pesquisadores americanos estudam uma abordagem imunoterápica que, com três injeções de anticorpos ao longo de seis semanas, conseguiu suprimir o HIV por até sete meses e meio. Os resultados promissores em humanos foram publicados nas revistas britânicas Nature e Nature Medicine.

A terapia utiliza as moléculas 3BNC117 e 10-1074, chamadas anticorpos amplamente neutralizantes ou bNAbs. Elas foram descobertas enquanto pesquisadores estudavam controladores de elites, pessoas infectadas pelo HIV cujo corpo combate com sucesso o vírus sem a necessidade de ingestão de drogas. Nesses indivíduos, os dois anticorpos agem de duas formas:  atacam as proteínas do lado de fora do micro-organismo e recrutam o sistema imunológico do corpo para combater a infecção. Por isso, os cientistas suspeitaram que o uso combinado dos bNAbs poderia evitar a resistência do vírus aos antirretrovirais.

Para testar a hipótese, realizaram um ensaio clínico em que participantes pararam de tomar antirretrovirais para receber três infusões dos dois anticorpos ao longo de seis semanas. A equipe constatou que o tratamento suprimiu o HIV por em média 21 semanas e mais de 30 semanas em alguns pacientes. Um primeiro teste foi feito com voluntários não virêmicos – o que significa que o HIV não estava circulando ativamente na corrente sanguínea porque os antirretrovirais reduziram consideravelmente o nível do vírus.

O segundo estudo clínico mostrou que os bNAbs também foram eficazes no tratamento de pacientes virêmicos. Nesses, a terapia combinada reduziu os níveis de HIV por até três meses. “O uso de bNAbs manteve a supressão entre 15 e mais de 30 semanas (em média, 21 semanas) e nenhum dos pacientes desenvolveu vírus resistentes a ambos os anticorpos. Com isso, concluímos que a combinação dessas moléculas pode manter a supressão a longo prazo na ausência de terapia antirretroviral”, ressaltaram os cientistas no artigo divulgado.

Limitações

Mesmo otimistas com os resultados, os pesquisadores ponderam que o tratamento com os anticorpos bNAbs tem limitações, já que há variedades de vírus da Aids, o que faz com que nem todos os pacientes respondam da mesma forma a um determinado anticorpo. “Esses dois anticorpos não vão funcionar para todos. Mas se começarmos a combinar essa terapia com outras dessas moléculas protetoras ou com drogas antirretrovirais, ela poderá ser eficaz em mais pessoas. E isso é algo que esperamos ver em estudos futuros”, afirma, em comunicado, Marina Caskey, uma das autoras e pesquisadora da Universidade de Rockefeller.

Segundo Michel C. Nussenzweig, líder do estudo e também pesquisador da universidade americana, com o passar do tempo, o uso terapêutico dos bNAbs poderá levar o corpo a produzir mais células de defesa contra o vírus. “Como alguns anticorpos contra cânceres, essas drogas podem interagir com o sistema imunológico do hospedeiro para aumentar a imunidade natural”, compara. Nussenzweig também acredita que mais pesquisas poderão ajudar a prolongar o tempo de efeito dos medicamentos. “A expectativa é de que essas novas variantes tenham meia-vida três a quatro vezes maiores. Dessa forma, poderemos ser capazes de dar os anticorpos uma ou duas vezes por ano”, cogita.

Alberto Chebabo, infectologista do Laboratório Exame, de Brasília, também acredita que um dos maiores ganhos da terapia proposta é a mudança na rotina medicamentosa. “Se tiverem uma duração de meses, esses anticorpos evitariam a necessidade de tomar pílulas diariamente. Pensando em um cenário extremamente positivo, teríamos a possibilidade de dar uma vacina anual no paciente, o que seria mais cômodo, garantindo um período extenso sem correr riscos”, cogita.

O médico brasileiro, porém, pondera que o estudo precisa ser aprofundado e que uma das futuras limitações poderá ser o custo do medicamento. “Esse tipo de anticorpo geralmente tem um preço alto, e isso poderá dificultar um pouco o uso mais amplo”, explica. “Outro ponto é que precisamos analisar um número maior de pacientes, pois, como disseram os autores da pesquisa, o vírus varia bastante. Isso faz com que a resposta possa ser distinta em alguns pacientes.”

Fonte: Correio Braziliense